setembro 18, 2014

PERSÉPOLIS



CAPÍTULO I

     Ei, pessoal, Ardinov está morto!
               A notícia explodiu como uma verdadeira bomba na Sala de Imprensa do Teatro General San Martin.
               Como? Repita!
               - O que aconteceu?
               - Quem morreu?
- Silêncio! – bradou alguém – Vamos, acalmem-se, com esta barulheira dos infernos ninguém ouvirá nada.
Todos se calaram quando ouviram a voz grave de Morales, o mais antigo dos correspondentes estrangeiros em Buenos Aires.
Juan se viu o centro das atenções. Chegara com uma notícia importante e agora fazia um pouco de suspense.
- Bem, eu... e olhava para os mais próximos provocando curiosidade – eu vim do Hotel Crillon. Estive lá bem cedo para entrevistar com Ardinov. Consegui furar o cerco da vigilância soviética. O corredor estava vazio àquela hora. Era muito cedo ainda, os hóspedes dormiam. Pude chegar até seu apartamento sem problemas. Bati na porta com todo cuidado. Ninguém atendia. Sem hesitar nem mais um momento, forcei a porta, antes que surgisse um empregado do hotel ou agente russo, não é? Não encontrei nenhuma resistência, ela cedeu facilmente, e...
- Ora, deixe de fazer romance – interrompeu um.
- Conta logo o que sabe, Juan – Ordenou Morales, impondo novamente sua autoridade de decano, quando ia iniciar a balbúrdia – Vamos aos fatos!
- Calma, contarei tudo direitinho – e procurando valorizar sua ação, continuou solene: - Entrei no apartamento. A sala estava vazia. Passei para o quarto. Vi Ardinov deitado na cama. Parecia dormir. Chamei por seu nome. Não acordava. Não fazia nenhum movimento. Eu precisava da entrevista com ele. Cheguei mais perto, olhei bem seu rosto e estranhei a palidez. Toquei seu corpo. Estava gelado. Levei o maior susto da minha vida. Ele estava morto. Sai dali correndo...

Os jornalistas internacionais e portenhos sofriam de uma terrível dúvida. Permanecer no Teatro General San Martin ou ir ao Hotel Crillon?
No auge da confusão os alto-falantes anunciavam o inicio da esperada disputa final entre o Mestre russo Tigran Petrossian e o americano Robert Fisher.
Na véspera, Ardinov jogara sob forte emoção. O adversário aproveitava suas indecisões para jogadas afoitas e decisivas. Na segunda partida já notava-se o descontrole do russo. Suava muito, e a cada instante enxugava as mãos e o rosto. O nervosismo aumentava. A assistência acompanhava obcecada a disputa. Ardinov comete uma falha incompreensível. O americano aproveita para tomar-lhe o peão central. Um sussurro percorreu a plateia, se transformando num vozerio incontrolável.
- Incrível, como pode ter feito isto?
- Ele está descontrolado.
- Deve estar doente.
- Que nada, o americano é melhor, e ele está com medo de perder.
- Ele já perdeu. Esta jogada foi o fim dele.
Preocupados com a partida, não repararam na presença de estranho “guru” indiano, que assistia impassível a partida, e muito menos o sorriso esboçado em seu rosto no momento da infeliz jogada do russo.
- Ardinov, o que achou de seu adversário? Vai pedir revanche?
- Senhores, por favor, estou fadigado. Amanhã darei uma entrevista coletiva.
Os mais persistentes seguiram–no até o Hotel. Todas as tentativas foram infrutíferas. Despediram-se na porta do elevador e viram quando subiu para seus aposentos.
Ardinov estava exausto. O semblante demostrava apreensão e temor. Deitou, procurando relaxar o corpo e espírito. Mal se acomodara no leito, teve um sobressalto. Visita inesperada surgia à sua frente, uma figura insólita. Não conseguia mover-se na cama. O estranho o fitava intensamente.

Agora o público aplaudia de pé a vitória de Fisher. A impetuosidade do americano vencera a seriedade de Petrossian. Os jornalistas mal se continham. Terminada a partida correram para a Sala de Imprensa. As edições extras dos jornais já estavam chegando. Ávidos de informações, disputavam os exemplares distribuídos. As manchetes estampavam: “MORRE CAMPEÃO RUSSO”.