agosto 27, 2014

Sylvia


Luigi rebelou-se. Resolveu esquecer Sylvia. Discou um número qualquer para convidar uma garota para sair. Na terceira chamada atenderam, e ele buscando uma voz tranquila e envolvente perguntou:
-Olá, quem fala?
- ...


Emudeceu. Era Sylvia quem respondia. Não conseguia tirar o fone do ouvido e nem falar. Espanto total. Angustiado, desligou o aparelho. Doutro lado a voz indagava inquietamente quem era. Saiu do apartamento em busca de liberdade. Andou durante muito tempo sem conseguir concatenar as ideias. Perdera o rumo dos passos. Olhou à sua volta para se localizar. Seria o local a que estava habituado a encontrar Sylvia? Outro engano seria um desastre.
O frescor do anoitecer melhorou seu ânimo. Uma fome voraz despertou sua atenção. Lembrou-se de um antigo restaurante especializado em massas, perto dali. Embarafustou por uma das ruelas e pelo aroma ia se orientando. Entrou no “Albergo Marietta”, tradicional trattoria com vinhos e queijos pendurados pelas paredes e teto, linguiças e outros petiscos à mostra. A boca encheu-se d’agua, aguçando-lhe o apetite.
A gentil garçonete indicou uma mesa de canto. Sentou-se satisfeito da vida. Logo colocaram à mesa um jarro de vinho, pão fresco e tira-gostos. Enquanto a moça arrumava os pratos pediu uma suculenta lasanha verde ao molho branco.
Distraído com a iguaria que pedira, nem notou os olhares de uma jovem. Só no meio da refeição é que percebeu a presença dela. Bem alimentado e começando a sentir os efeitos do vinho, afastados os tormentos, começou a interessar-se por ela. Os olhos lindos, cabelos castanhos, compridos, emolduravam o rosto gracioso.  Beirava os vinte anos.
- Seria interessante um namorico, para distrair – pensou Luigi já bolando um plano de ataque.
Um grupo de rapazes a rodeavam alegres. Luigi levantou e ousadamente encaminhou-se para a outra mesa. Admirado viu que a moça virava-se frontalmente para ele, como para o receber, evitando assim uma situação constrangedora perante seus amigos.
Na manhã seguinte acordou com uma preguiça enorme. Ainda guardava a lembrança da noitada alegre e descompromissada. Realmente Angélica era encantadora e o fez esquecer todas as agruras que havia passado nos últimos dias. Namorara inocentemente como há muito tempo não fazia. E sentiu um pequeno remorso pela sua leviandade. Sabia que não poderia levar avante aquele namoro. Resolveria o caso, sem magoá-la, antes que se envolvessem mais.
E de repente, em meio aos seus pensamentos gritou: - Santo Deus, esqueci-me de Sylvia. Tenho de ir à estação!
Levantou feito um louco, tropeçando nos móveis e roupas espalhadas pelo chão.



- Oh! Luigi, pensei que não viesse, o que aconteceu com você?
- Desculpe-me Sylvia, mas é que fui dormir tarde e perdi a hora.
- Pela sua cara foi uma farra e tanto.
- Não brigue comigo agora, estou tão feliz!
- Nota-se!
- Você nem pode adivinhar o que me aconteceu. Encontrei ontem uma garota celestial. Verdadeiro milagre!
- Como um milagre?
Luigi esfriou com a pergunta. Ia responder quando tocou o primeiro sinal. As pessoas à volta movimentavam-se para tomar o trem.
O silvo longo e estridente foi o último aviso. A locomotiva preparava-se para a partida. Os dois se olhavam silenciosos. Luigi mal podia conter o riso de felicidade. Sylvia procurava analisar o estranho comportamento do amigo tomada por uma expectativa enorme, fora do comum.
Um longo abraço de despedida e Luigi a beijou delicadamente no rosto.
- Minha tristeza deve ser por causa da partida – pensou Sylvia – é isto, só pode ser isto, não há outra razão para me sentir assim...
Partia para Veneza em busca de tranquilidade. A esperança de novos rumos para sua vida, toldada por um sentimento até então desconhecido.
O tempo passou, os trilhos correndo aos seus pés, o barulho monótono do trem, adormeceu.
Despertou da sonolência com o toque no braço, era o camareiro alertando para a hora do almoço. E vendo que a vida continuava levantou:  

- Luigi, Roma, tristezas, ficaram para trás, agora é tratar de me divertir e aproveitar as férias. Ciao.


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